terça-feira, 22 de março de 2011

A velha

Todos os dias pela manhã, mamãe fazia o café enquanto tomávamos banho... A casa inteira ficava perfumada com o aroma do café quente e fresco...
Que delícia! Ela costumava fazer também broinhas de milho e a casa ficava aconchegante com o formo aceso, lá fora a rua era escura e o vento balançava o cipreste que ficava em frente ao nosso portão.
Depois de tomarmos nosso café, íamos para o quintal brincar de qualquer coisa que nossa imaginação quisesse.
Era meio de outono e as árvores já estavam todas sem folhas e as poucas que sobravam já eram secas, marrons e a qualquer movimento desprendiam-se.
Corríamos por entre as árvores, o chão coberto de folhas abafava nossos passos, podíamos cair à vontade que ninguém se machucava. Sentíamos o cheiro gostoso das flores, tudo era muito bonito e mágico, o vento bagunçava nosso cabelo, jogando-o para todos os lados.
Mamãe nos deixava brincar um pouco e vez ou outra nos chamava para tomar algo quente.
Do outro lado da rua havia uma velha, ficava noite e dia sentada em sua cadeira de balanço, com uma manta xadrez nas pernas e um xale grosso de lã nas costas. Havia uma varanda de vidro na casa dela e era de lá que nós a víamos todos os dias.
Ninguém da rua notava aquela pobre senhora sentada em sua cadeira, um dia pela manhã ela não estava na varanda, no dia seguinte também não, avisamos mamãe que achou que a velha senhora devia estar cansada de sentar-se na varanda e resolveu ficar dentro de casa.
Eu e meus irmãos éramos muito curiosos e não ficamos satisfeitos com esta conclusão de mamãe, saímos de mansinho e entramos na casa da velha. Lá a encontramos deitada muito febril.
Voltamos para casa gritando e nossa mãe correu para saber o que havia acontecido, contamos sobre nossa aventura e ela e mais duas vizinhas foram até lá, conseguiram entrar em contato com uma filha que morava no Paraná e que só chegaria no fim de semana. Mamãe e as vizinhas limparam a casa da pobre velhinha, a medicaram e deram banho. No dia seguinte ela estava bem melhor, ainda não podia sentar-se na varanda, mas andou um pouco dentro de casa.
O fim de semana chegou e com ele a filha da boa senhora, ela veio com um caminhão de mudança e embalou todos os pertences... No dia seguinte a casa já estava vazia e a varanda tornou-se triste e solitária.
Mamãe agradeceu o que fizemos, pela pobre velha, mas nos deixou de castigo uma semana para que aprendêssemos a não desobedecê-la mais e nunca invadir a casa das pessoas. Merecemos o castigo, mas estávamos felizes por ter ajudado a pobre velhinha da varanda...


Na rua da escola...

Na rua da escola havia uma casa desabitada a muitos anos. Ela não estava bem na rua e sim na esquina ao final da rua da escola, era próxima a vendinha do senhor Joaquim.
Bem, criança sabe como é, não pode ver uma casa vazia que já inventa coisa, mas esta casa em especial era meio estranha.
O portão era alto, de ferro escuro e retorcido, ficava em um corredor e a frente da casa estava toda quebrada, com os vidros da janela no chão e cheios de terra no quintal. Este corredor que dava para o portão era estreito, escuro e sujo e nos fundos da casa havia montes de terra, eram montes enormes com um formato meio suspeito e num canto meio escondido pela vegetação rasteira e os arbustos que crescia havia lousas de granito iguais as que vemos em cemitérios.
Sabíamos de tudo isso por que subíamos no muro da casa e espiávamos horas a fio, eu nunca entrei, sempre fui muito medrosa, mas, minhas amigas mais corajosas entravam e diziam coisas estranhas.
Diziam que aqueles montes de terra na verdade eram sepulturas, certa vez viram uns pedaços de madeira debaixo da terra, cavaram e encontraram um caixão, aquelas lousas escondidas eram as que ficavam na cabeceira das sepulturas e nelas estavam os nomes da esposa e dos filhos do homem que morou naquela casa.
A história que todos os alunos contavam era sempre a mesma com pouquíssimas alterações. Basicamente o dono da casa era louco e num dia de fúria assassinou mulher e filhos. Disseram que na geladeira estavam as cabeças e os corpos debaixo dos montes de terra no fundo do quintal.
Nunca soube realmente a verdade, certeza é que um dia, carros da polícia pararam em frente daquela casa e o levaram algemado.
Nunca mais ninguém viu aquele homem ou sua família novamente, daí as crianças contarem o que bem imaginavam, creio que a lenda urbana sobre a casa nasceu deste incidente com o dono da mesma.
A verdade é que até hoje quando lembro daquela velha casa sinto um arrepio na espinha e vejo perfeitamente aqueles três montes de terra no fundo do quintal, depois de muitos anos um conhecido comprou aquela casa e fez uma loja, depois derrubou e construiu um lindo barzinho que não foi para frente, sei lá, diziam que ao passar por lá tarde da noite ouviam-se sons de pá cavando terra e viam luzes fracas acesas no interior da casa.
Eu prefiro acreditar que talvez fosse o dono tentando arrumar alguma coisa para melhorar o bar, mas os vizinhos desacreditam já que o bar foi fechado pouco tempo depois da inauguração, o dono teve uma overdose de comprimidos para dormir.
E você? O que acha? Verdade ou fruto da imaginação?