quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Show do Bruce Springsteen em Sampa, eu fui \o/


Durante as 3 horas e 16 minutos de duração de seu show em São Paulo na noite desta quarta-feira (18), Bruce Springsteen tocou Raul Seixas, “surfou” sobre o público (e neste momento ele tinha uma marca de batom na bochecha direita), chamou um jovem casal ao palco para que o rapaz pudesse pedir a namorada em casamento (ela respondeu “sim”), tomou um copo de cerveja durante um de seus passeios pela plateia (bebeu tudo de um único gole), acariciou a barriga de uma fã grávida e brincou que queria namorar uma senhora à frente do palco.
 
São passagens suficientemente inusitadas para tornar histórica a apresentação no Espaço das Américas, a primeira no país desde 1988. Mas houve tempo para que ele mostrasse, em 29 canções, por que sua turnê com a E Street Band foi recentemente apontada como a melhor da atualidade pela edição americana da revista "Rolling Stone". E, sobretudo, por que sua reputação sobrevive a despeito dos eventuais clichês que oferece – ainda que tudo pareça espontâneo. Neste sábado (21), Bruce Springsteen é a atração principal do Palco Mundo, no Rock Rio.
 
Em São Paulo, ele entra no palco às 21h14 – está rodeado por outros 17 músicos. A casa, visivelmente, não está com sua capacidade de 8 mil pagantes esgotada, é fácil circular pelo setor próximo ao palco. Bruce diz "Hello, São Paulo" e, em português, "estou muito feliz por estar aqui". Os acordes iniciais provocam estranheza, dado que não se assemelham a nada que esteja no repertório habitual do astro. O número de abertura é um cover: "Sociedade alternativa", de Raul Seixas, cantada no idioma nativo e em versão pesada, com metais em destaque. O público corresponde, acompanha com empenho. A disposição se mantém na próxima, um hit relativo, “We take care of our own”. Em “Badlands”, ela beija uma idosa da primeira fila. Em “Death to my hometown”, mostra que sua voz, ao vivo, é mesmo daquele jeito. Quanto termina esta, a 4ª da noite, ele acha certo arremessar a guitarra em direção ao fundo do palco – aparentemente, alguém conseguiu pegar o instrumento no ar.
 
Na sequência, breve discurso: “Viajei milhares de quilômetros para estar aqui hoje. Vocês estão sentindo o astral?”. E, aí, ele começa a gritar, em variados graus de intensidade, fazendo lembrar inclusive Brian Johnson, do AC/DC : “Can you feel the spirit?!”. É aqui que vem a primeira manifestação de coragem – ou descontrole: Bruce interage com a gestante, desce do palco, caminha pela lateral da casa e, correndo, chega ao “corredor” que secciona em dois o Espaço das Américas: área VIP e área comum. Fica ali um instante, canta, se deixa abraçar (os mais ousados se atrevem em apalpadas) e, em dado momento, olha para o palco e indica que quer voltar para lá. Não pelo caminho que tinha usado, mas, sim, pelo meio da plateia, “surfando”. O desejo é atendido, e lá vai ele, com o rosto marcado por um beijo.
 
Neste momento, Bruce está bastante suado. De tempos em tempos, encharca uma esponja posicionada ao lado da bateria e a espreme na nuca ou sobre a cabeça. Também bebe alguma coisa não identificável. Na segunda “visita” aos fãs, sobe no balcão do bar e ganha um copo de cerveja de alguém. Toma cerca de dois terços do conteúdo de uma vez e só lança o plástico para o alto. Quem está perto vibra. Mesmo porque a música que ele estava cantando àquela altura era o hit “Hungry heart”. Tinha sido um pedido do público, procedimento habitual durante shows de Bruce e repetido aqui. A empolgação é tanta, que o povo aplaude até o solo de gaita em “Darkness on the edge of town”. “No surrender” e “Bobby Jean” são outras que ele pinça de cartazes erguidos por admiradores.
 
A passagem mais incomum vem na 14ª da noite: “She’s the one”. Um jovem mostra um aviso, onde se lê, em inglês: “Deixe-me pedi-la em casamento”. Bruce deixa, e parece realmente impressionado ao notar a resposta afirmativa da moça. Outros convidados virão: uma criança que, tímida, canta o refrão final de “Waiting on a sunny day” – no final da participação, Bruce, com um braço só, ergue-a nos ombros –; e um grupo de seis garotas e um garoto em “Dancing in the dark”, a 25ª. São instantes de dispersão que pouco contribuem, mas os fãs adoram. Ninguém questiona ou acha ruim, nem as exageradas intervenções do empenhado saxofonista, que se contribui para algo, é para lançar o repertório em algum ponto questionável dos anos 1980. Nada que comprometa, e Bruce aprova a "contribuição". Trata-se de um desconforto mínimo e tolerável – a exemplo do cover de "Because the night", de Patti Smith –, se levado em consideração o conjunto da obra. Um nada se comparado à sequência “Born in the USA” e “Born to run”.
 
A quarta-feira acaba de virar quinta quando Bruce, efetivamente molhado, tira a camisa e fica apenas com a camiseta que vestia por baixo. Está em forma, mas aparenta cansaço. Mesmo assim, dá um jeito de subir no piano. Tudo parece que vai acabar, mas não. Prestes a completar 64 anos – o aniversário é em 23 de setembro –, ele pega a guitarra de novo e regressa com a dançante “Shout”. Na área VIP, forma-se uma roda, com um cadeirante ao centro se movimentando de olhos fechados. No meio da execução, Bruce se ajoelha no palco, brinca com o próprio esgotamento. E volta à carga para as derradeiras.
 
O show termina à meia-noite e meia. Antes da última, o solo acústico “This hard land”, Bruce ouve coros de "Olê, olê, olê... Bruce, Bruce!" (a pronúncia é algo como "Brucê, Brucê"). Gasta, então, 4 minutos para se desculpar pela ausência de 25 anos, agradecer pela recepção positiva, prometer que regressará em breve e assumir o lugar-comum: “Vocês são o melhor público do mundo”. Podia ser um exagero, mas não estaria mal se qualquer pessoa da audiência devolvesse o elogio.