Há muitos anos atrás no bairro do Borá, havia um homem chamado José Anselmo, mais conhecido como Zé Anselmo. Ele era um senhor de cabelos brancos e encaracolados, vivia carregando um saco de ossos jogado nas costas. Era doente, até hoje não me lembro bem o que ele tinha realmente já que na época eu era muito pequena e morria de medo dele por conta das histórias que minha mãe e os vizinhos contavam.
Morávamos em um sítio bem afastado da cidade, era um local de difícil acesso com muitas árvores, a estrada de terra era próxima, mas para chegar até a cidade levava muito tempo a pé ou montado a cavalo.
Para chegarmos à escola demorava bem uns quarenta minutos andando ou mais, passávamos por muitos caminhos até chegarmos ao nosso destino. Geralmente enfrentávamos muitas aventuras, não gosto nem de lembrá-las, sinto o frio na barriga e a garganta seca de tanto medo. A parte pior de nossa ida à escola era atravessar o cafezal. Logo após o cafezal passávamos pelo meio de diversos pés de mangas, lindos, carregadinhos de frutas amarelo-avermelhada que davam água na boca e o perfume então? Desta parte gosto de lembrar, mas só até aí.
Lembro-me de que Zé Anselmo costumava subir na copa destas árvores para chupar manga e uivar. Parecia um lobisomem uivando daquela forma, a boca escancarada, os dedos sujos do caldo das mangas, o cabelo esbranquiçado revolto ao vento e a neblina que não nos deixava enxergar quase nada à nossa frente. A barra de nossas saias do uniforme ficava encharcada das gotas de orvalho que se acumulavam nas touceiras pelo meio do caminho, quando finalmente chegávamos à escola, nossos pés estavam molhados.
Nenhum de nós se arriscava passar por aquelas terras sozinhos, já era muito difícil chegar até ali, pois no meio do caminho precisávamos driblar os gansos que sempre corriam atrás de nós com o bico aberto e os dentes expostos. Crianças que moram na roça passam por maus bocados se já não bastasse tudo isso, ainda tínhamos que passar em frente a um casebre bem rústico na beira da estrada onde morava um senhor muito idoso, era bem magro, bem comprido e bem assustador. Ficava o tempo todo, todos os dias durante todos os anos sentado em sua cadeira de rodas com um cobertor enrolado nas pernas e de touca na cabeça atirando farelo de pão para as pombas. Eu particularmente era a mais medrosa dentre meus irmãos e só de ver aquele velho me enchia de pavor. O quintal dele era lotado de pombas arrulhando bem alto e eu batia o pé que aquele barulho era produzido pelo idoso. Durante muitos anos depois eu não podia ver um senhor idoso que me lembrava daquele ancião das pombas e o pavor me enchia novamente o peito... Novamente o medo das crianças é algo estarrecedor não acha?
Pois bem, certa vez nós estávamos a caminho da escola quando de dentro do nevoeiro avistamos a figura de Zé Anselmo no meio do caminho. Estava parado bem no meio da estrada igual uma pedra e segurava seu saco de ossos, uivava alto naquela manhã. Tínhamos que passar por ali, não havia outro caminho para seguir, nenhuma ponte, ou até mesmo uma estradinha na perpendicular, aquele era o nosso caminho.
Ficamos parados no meio do sereno tiritando de frio, mas não arredávamos o pé. Ele estava tranqüilo, não saia do lugar, só uivava. Ficamos tanto tempo parados por ali que nem percebemos o tempo passar, quando por fim ele resolveu continuar seu caminho já estava na hora de voltarmos para casa.
Nunca vou me esquecer deste dia, passei um medo tão grande que depois daquele ocorrido não me lembro mais de ter sentido algo tão horripilante como aquele episódio.
Como já havia dito, vida de criança não é mole! Zé Anselmo coitado era apenas um homem com alguma síndrome que desconheço, sei que me fez sentir muito medo quando menina, mas hoje em dia lembro esta época com saudades. Com certeza já deve ter morrido, afinal de contas ele já era um idoso quando nos assombrava... E aí, será que você se arriscaria a passear pelo meio do cafezal ao entardecer escutando os uivos de Zé Anselmo? Quer saber, definitivamente eu não toparia!
Morávamos em um sítio bem afastado da cidade, era um local de difícil acesso com muitas árvores, a estrada de terra era próxima, mas para chegar até a cidade levava muito tempo a pé ou montado a cavalo.
Para chegarmos à escola demorava bem uns quarenta minutos andando ou mais, passávamos por muitos caminhos até chegarmos ao nosso destino. Geralmente enfrentávamos muitas aventuras, não gosto nem de lembrá-las, sinto o frio na barriga e a garganta seca de tanto medo. A parte pior de nossa ida à escola era atravessar o cafezal. Logo após o cafezal passávamos pelo meio de diversos pés de mangas, lindos, carregadinhos de frutas amarelo-avermelhada que davam água na boca e o perfume então? Desta parte gosto de lembrar, mas só até aí.
Lembro-me de que Zé Anselmo costumava subir na copa destas árvores para chupar manga e uivar. Parecia um lobisomem uivando daquela forma, a boca escancarada, os dedos sujos do caldo das mangas, o cabelo esbranquiçado revolto ao vento e a neblina que não nos deixava enxergar quase nada à nossa frente. A barra de nossas saias do uniforme ficava encharcada das gotas de orvalho que se acumulavam nas touceiras pelo meio do caminho, quando finalmente chegávamos à escola, nossos pés estavam molhados.
Nenhum de nós se arriscava passar por aquelas terras sozinhos, já era muito difícil chegar até ali, pois no meio do caminho precisávamos driblar os gansos que sempre corriam atrás de nós com o bico aberto e os dentes expostos. Crianças que moram na roça passam por maus bocados se já não bastasse tudo isso, ainda tínhamos que passar em frente a um casebre bem rústico na beira da estrada onde morava um senhor muito idoso, era bem magro, bem comprido e bem assustador. Ficava o tempo todo, todos os dias durante todos os anos sentado em sua cadeira de rodas com um cobertor enrolado nas pernas e de touca na cabeça atirando farelo de pão para as pombas. Eu particularmente era a mais medrosa dentre meus irmãos e só de ver aquele velho me enchia de pavor. O quintal dele era lotado de pombas arrulhando bem alto e eu batia o pé que aquele barulho era produzido pelo idoso. Durante muitos anos depois eu não podia ver um senhor idoso que me lembrava daquele ancião das pombas e o pavor me enchia novamente o peito... Novamente o medo das crianças é algo estarrecedor não acha?
Pois bem, certa vez nós estávamos a caminho da escola quando de dentro do nevoeiro avistamos a figura de Zé Anselmo no meio do caminho. Estava parado bem no meio da estrada igual uma pedra e segurava seu saco de ossos, uivava alto naquela manhã. Tínhamos que passar por ali, não havia outro caminho para seguir, nenhuma ponte, ou até mesmo uma estradinha na perpendicular, aquele era o nosso caminho.
Ficamos parados no meio do sereno tiritando de frio, mas não arredávamos o pé. Ele estava tranqüilo, não saia do lugar, só uivava. Ficamos tanto tempo parados por ali que nem percebemos o tempo passar, quando por fim ele resolveu continuar seu caminho já estava na hora de voltarmos para casa.
Nunca vou me esquecer deste dia, passei um medo tão grande que depois daquele ocorrido não me lembro mais de ter sentido algo tão horripilante como aquele episódio.
Como já havia dito, vida de criança não é mole! Zé Anselmo coitado era apenas um homem com alguma síndrome que desconheço, sei que me fez sentir muito medo quando menina, mas hoje em dia lembro esta época com saudades. Com certeza já deve ter morrido, afinal de contas ele já era um idoso quando nos assombrava... E aí, será que você se arriscaria a passear pelo meio do cafezal ao entardecer escutando os uivos de Zé Anselmo? Quer saber, definitivamente eu não toparia!